Governo catalão de independentistas em rutura cinco anos após referendo
29/09/2022
A poucos dias do quinto aniversário do referendo de 01 de outubro de 2017, Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e Juntos pela Catalunha (JxCat) assumiram as suas desavenças num debate no parlamento regional, na terça-feira, e a troca de acusações culminou com o afastamento do vice-presidente do governo regional catalão (também conhecido como Generalitat), Jordi Puigneró, pelo presidente do executivo, Pere Aragonès, na quarta-feira à noite.
Puigneró é do JxCat (o partido do líder da tentativa de autodeterminação de 2017, Carles Puigdemont) e Aragonès é da ERC.
Os dois partidos são independentistas, mas a ERC é mais moderada e defende que o caminho para a independência deve ser o do diálogo com o Governo central de Espanha, com quem deve ser negociada a realização de um novo referendo.
O Governo central espanhol, atualmente liderado pelo socialista Pedro Sánchez, tem o apoio, no Congresso dos Deputados (o parlamento nacional), da Esquerda Republicana da Catalunha, e aprovou, em junho de 2021, indultos para nove líderes independentistas catalães que estavam a cumprir penas de prisão por causa da declaração unilateral de independência e a realização do referendo de 2017.
Poucos dias depois dos indultos, o Governo espanhol e o executivo regional catalão anunciaram o reatamento do diálogo “sobre o conflito político entre os dois governos”, nas palavras de Aragonès.
Nesta mesa de diálogo só se senta, do lado catalão, a ERC, que decidiu que o JxCat só teria um lugar se nomeasse um membro do governo regional, algo que o partido recusou.
Já este ano, em julho, a ERC votou a favor da suspensão da presidente do parlamento regional, Laura Borràs, que é a presidente do JxCat, por estar envolvida em casos de corrupção.
Meses depois, em 11 de setembro, Aragonès recusou participar na tradicional manifestação independentista nas ruas de Barcelona no dia da região, invocando que não queria ser vaiado pelos militantes do JxCat.
Na última terça-feira, durante um debate parlamentar, as desavenças entre os dois partidos, públicas e num crescendo desde que se formou a atual coligação de governo, em maio de 2021, chegaram ao ponto de o líder parlamentar do Juntos pela Catalunha, Albert Batet, desafiar Pere Aragonès a submeter-se a uma moção de confiança na assembleia regional, para comprovar se ainda tem apoio da maioria dos deputados, depois de “não haver avanços no programa independentista”.
Aragonès classificou o desafio como uma “deslealdade” e invocou “perda de confiança” no “número dois” do governo regional, que demitiu, pedindo ao JxCat para nomear um substituto.
Todos os sete membros do executivo que são do JxCat puseram o seu lugar à disposição do partido, cuja direção passou todo o dia de hoje reunida, para decidir o que fazer, sem que, passadas mais de sete horas de encontro, seja conhecido um desfecho.
A ERC já rejeitou “rotundamente” eleições antecipadas no caso de o JxCat abandonar o governo regional.
Quem ganhou as eleições catalãs de 2021 foi o partido socialista, mas sem maioria absoluta, pelo que uma aliança entre ERC e JxCat acabou por formar o atual governo de independentistas.
Os socialistas tiveram mais votos, mas ficaram com o mesmo número de deputados da ERC (33), enquanto o JxCat tem 32 assentos no parlamento regional.
O líder dos socialistas catalães, Salvador Ila, em declarações a jornalistas em Barcelona hoje, não quis pronunciar-se sobre se será preciso haver eleições no caso de o JxCat deixar o governo regional por considerar que é necessário, primeiro, “ouvir” Aragonès.
“Não é um momento de aventuras” e se a ERC “quer governar em minoria” sem ter ganhado as eleições, terá de “explicar como quer fazê-lo e com quem”, disse Illa.
A rutura e desentendimentos entre os dois maiores partidos independentistas da Catalunha é um símbolo, para os analistas e editoriais da imprensa espanhola, do estado em que ficou e está esta causa depois da tentativa de autodeterminação de 2017.
A sondagem mais recente do Centro de Estudos de Opinião da Catalunha, que faz barómetros trimestrais, revelou que, em julho, 52% dos catalães é contra a independência, a percentagem mais elevada desde 2015.
Aqueles que apoiam a independência da Catalunha são 41% (em 2017 chegaram aos 49%), segundo os mesmos dados.
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